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“Coragem, lute!”: a querência da Vila Autódromo


Vista aérea da Vila Autódromo. Foto: Reprodução.

Segunda feira é dia em que a cidade "acorda" e tudo volta ao normal. Trabalho, casa, faculdade, filhos e tudo mais. A rotina é a mesma, ou talvez não. Nesse caso, como diria Bárbara Falcão, segundas feiras são segundas chances, um recomeço.

A ideia era acordar cedo para começar nossa deriva na Vila Autódromo (Michel, Victor, Amanda e eu). Entramos no ônibus, o dia estava nublado e apresentava grandes chances de chuva. O coletivo não estava cheio – na verdade, não vi nenhum ônibus cheio nessa cidade. Demoramos cerca de uma hora para chegar à Vila. Descemos do veículo e começamos a andar.

Não sabíamos muito bem onde era a Vila Autódromo. O que víamos eram grandes construções, muito barulho de carro e uma farmácia, perto do ponto em que descemos. Fizemos uma pergunta para uma mulher que logo nos respondeu: “Podem seguir em frente que vocês vão encontrar a Vila a seguir”.

Quando chegamos ao lugar que a mulher havia indicado, pensamos que talvez não fosse ali. Paramos para observar por um momento. Faixas e pichações indicavam que naquele lugar havia pessoas lutando por seus direitos.

De longe, outra mulher nos olhava apreensiva. Decidimos chegar e conversar sobre nosso objetivo na Vila. Ela vigiava a entrada bloqueada por barricadas e, sem muitos questionamentos, liberou nossa entrada, naquela tarde que reservava muitas emoções.

Começamos nossa caminhada, irrequietos por não saber o que iríamos encontrar e por perceber como o “clima” naquele lugar estava tenso. Logo depois da entrada na Vila encontramos um barzinho e a informação de que na Igreja do local estava acontecendo uma reunião com o pessoal da comunidade sobre a situação em que as pessoas ali se encontravam.

Saímos em busca da reunião para saber sobre a realidade dos moradores que estavam sendo despejados devido às construções para as Olimpíadas. Várias casas, memórias e sentimentos estavam no chão. Sem sucesso com nossa busca, decidimos continuar andando pelas ruas em que ainda apresentavam casas erguidas.

Pisávamos em escombros e percebíamos que estávamos passando dentro do que um dia foi uma casa. As imagens nos chocaram. Vi sapatos, pente e até mesmo roupas no chão, tudo misturado àquele ar de destruição.

A angústia começou a tomar forma dentro dos corações fracos. A sensação de incapacidade tomou conta por não podermos ajudar aquelas pessoas que lutam por aquilo que é delas e está sendo tirado sem um motivo satisfatório. Ficamos em silêncio e não aguentamos. As lágrimas foram inevitáveis.

Sem esperanças de encontrar algum morador que nos falasse o que sentia no meio daquilo tudo, continuamos nossa caminhada até que Dona Jane nos encontrou. Sem marcar nada, as coisas a partir daquele momento começaram a se encaminhar.

Jane nos explicou tudo que estava acontecendo, desde as agressões da polícia com os moradores até o descaso da prefeitura. Era impressionante seu conhecimento sobre as leis e sobre o Poder Judiciário. Chovia e então procuramos um abrigo para continuar nossa conversa. Passados alguns minutos, Jane chamou pelo nome de uma mulher, Dona Denise, que logo apareceu na porta de sua casa e nos convidou para entrar.

Passamos boa parte da tarde conversando sobre a situação vivida pelos moradores da Vila. Era difícil conter a emoção em meio a tantas palavras de luta e força de vontade.

Depois da conversa, depois de ter entendido o que aqueles moradores estavam passando, fomos embora tristes, esperançosos, angustiados e pensativos. Tristes por ver toda aquela destruição, esperançosos por saber que há pessoas que ainda lutam por seus direitos, angustiados por não saber o que poderia acontecer com Dona Jane e Denise e pensativos sobre a questão do capital falar mais alto nessa sociedade “democrática”.

Como segundas-feiras são segundas chances, essa segunda terminou diferente. Com o sentimento de mudança social e da querência do bem, da querência da igualdade e acima de tudo, do respeito ao próximo. “CORAGEM, LUTE!” é o que dizia uma das frases na Vila. Fomos embora com esse pensamento. Queremos lutar, queremos resistir!


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